photo: rogério barroso. Foto nº 45 - Melros - Parque do Tejo, Lisboa.
Treze formas de olhar um melro1 Entre vinte montanhas nevadas A única coisa a mover-se Era o olho do melro. 2 Eu tinha três pensamentos Como uma árvore Em que há três melros 3 O melro girava nos ventos de outono. Era uma pequena parte da pantomima. 4 Um homem e uma mulher São um. Um homem e uma mulher e um melro São um. 5 Não sei o que preferir: A beleza de inflexões Ou a de insinuações, O melro assoviando Ou o imediatamente após. 6 Sincelos cobriam a longa janela De vidro barbaresco. A sombra do melro a atravessava, p'ra lá e p'ra cá. A disposição de espírito Traçava na sombra Uma causa indecifrável. 7 Oh homens magros de Haddam, Por que imaginais pássaros dourados? Não vedes como o melro Caminha à volta dos pés Das mulheres à vossa volta 8 Sei nobres tons E ritmos lúcidos, inevitáveis. Mas sei também Que o melro está envolvido Naquilo que sei. 9 Quando o melro sumiu de vista, Marcou a orla De um entre muitos círculos. 10 À simples visão de melros Voando numa luz verde, Mesmo as alcoviteiras da eufonia Emitiriam uivos agudos. 11 Atravessou Connecticut Num coche de vidro. Uma vez o medo o trespassou: Foi quando tomou por melros A sombra da carruagem. 12 O rio se move. O melro deve estar voando. 13 A tarde toda era um fim de tarde. Nevava E ia nevar. 0 melro estava assentado Nos galhos do cedro. JOÃO MOURA JR. é poeta e jornalista, (matéria publicada em jan/1984 no suplemento da Folha de São Paulo intitulado Folhetim.) |
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